A notícia, agora, é de terem sido entregues cartas de despedimento a 222 trabalhadores. Outros 18 aceitaram rescisões “amigáveis” por se encontrarem perto da idade da reforma, perfazendo assim, neste último despedimento 240 despedidos.

Anteriormente o processo de despedimento vinha a ser realizado pela não renovação de contratos temporários. Há dois meses, em Abril passado, tinham sido despedidos por essa via 67 operários. Outros cerca de 200 operários (grande parte mulheres) foram progressivamente despedidos anteriormente por essa mesma via.

A Gabor é uma empresa alemã, com uma pequena fábrica em Rosenheim, Bayern, e duas fábricas principais, uma em Portugal, a Gabor Portugal - Indústria de Calçado, Lda. em Silveiros, e outra na Eslováquia, a Gabor Spol. S R.O. em Banovce Nad Bebravouslowakei. A fábrica da Eslováquia explora cerca de 1000 operários na fabricação de componentes para a indústria do calçado e afins em couro, tecido, borracha, plástico e metal.

Se anteriormente a Gabor Portugal absorvia as “flutuações do mercado” com o recurso ao exército industrial de reserva, ora mobilizando-o ora desmobilizando-o, transferindo assim os custos do que chamam de “riscos dos investimentos” para as costas dos operários, agora foi directamente ao núcleo duro da empresa, numa redução de cerca de 25% na capacidade de produção! Desta vez não foram só operários, foram equipas inteiras! O argumento apresentado é a necessidade de ajustar a capacidade produtiva num contexto económico de crise de encomendas devido a quebra acentuada nas vendas, e de acumulação e excesso de stocks. Catástrofe mercantil? Os alemães deixaram de comprar calçado (convém saber que a quase totalidade da produção da Gabor é exportada para a Alemanha)? Surgiu nesse mercado um competidor demolidor? Não, nada disso!

Quando muito, a existir um competidor demolidor, ele é a própria Gabor. Neste momento estão a ser fabricados na Índia centenas de milhares de pares de sapatos Gabor, porque a Gabor franqueou a marca à empresa indiana

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TATA International que tem duas fábricas de calçado, uma em Dewas, no estado de Madhya Pradesh, e a outra na capital do estado de Tâmil Nadu, Madrasta, com uma capacidade de produção conjunta mensal de 200 000 pares de sapatos e 13 000 outros artigos de couro. Daí terem vindo da Índia para Silveiros algumas dezenas de operários aprenderem a fabricação.

Sendo a Índia o maior exportador mundial de calçado em couro (com um preço médio de 9€/par comparando com os 30€/par do preço médio do calçado exportado por Portugal), a Alemanha é o seu terceiro maior cliente (após os EUA e o RU). Trata-se, portanto, de plano gisado em Rosenheim para aumentar a taxa de lucro transferindo partes da produção para a Índia num processo semelhante ao que “beneficiou” Portugal há 39 anos quando a Gabor abriu a fábrica na Trofa e depois a transferiu aumentada para Silveiros.

É o capitalismo a funcionar na sua maior perfeição. Só que ninguém esperava, nem era preciso, tamanha crueldade e tão grande desprezo pela dignidade dos trabalhadores. Não houve “preparação”: os trabalhadores foram surpreendidos durante o trabalho com as cartas de despedimento; alguns, em baixa, foram chamados à fábrica para receberem a carta; e até foi pedido a uma mãe que levasse a carta ao filho e que, em terror, assinou por ele; de tudo se viu! Fala-se em clima de funeral entre os trabalhadores.

Há famílias inteiras entre os que receberam as cartas; muitos estão a comprar casa e/ou a comprar carro. 3 meses não é nada para encontrar outro emprego! O que acontecerá quando as arrecadas se esgotarem, sendo que os encargos se vão manter?

 Que dizer de um regime que obriga quem não tem tecto e quer viver dignamente a comprar casa e depois permite o despedimento de quem depende da venda da sua força de trabalho para pagar o empréstimo que contraiu para a pagar? 

Na Gabor não existe comissão de trabalhadores e o número de sindicalizados é reduzidíssimo. Os sindicatos sempre se mantiveram à margem e nem o facto de a camarada Maria José ser delegada e dirigente do Sindicato do Calçado, Malas e Afins, Componentes, Formas e Curtumes do Minho e Trás-os-Montes o moveu para tomar posição e organizar a resistência dos trabalhadores ao despedimento. 

É preciso que uma comissão de trabalhadores se constitua e conteste os despedimentos, não que discuta os critérios de escolha dos despedidos como é pretendido, mas que ponha em causa a "medida de gestão adequada, proporcional e racional" do sr. Ralf Rasemann. Os argumentos patronais são falaciosos pois basta que reduza o montante de calçado contratado com a TATA International para o argumento do contexto económico de crise de encomendas e quebra acentuada das vendas da Gabor Portugal (não da Gabor a casa mãe e “compradora” alemã que continua a vender normalmente na Alemanha, Áustria, Bélgica, Suiça, França, Itália, Holanda, Suécia e, a partir do Reino Unido, para o resto do mundo, mas da Gabor Portugal, entenda-se) cair. E a TATA International pode muito bem direcionar a capacidade produtiva libertada para mercados sedentos de calçado como o chinês (cujos preços de importação médios estão acima dos 30€/par, muita acima dos 9€/par das exportações indianas – dados de 2024 da APICCAPS, in “O CALÇADO NO MUNDO”).

Isto para já. Mas sabemos que novas ondas virão. São inevitáveis. O capitalismo é assim: vive da exploração do trabalho e do permanente trucidar da classe operária, de facto, do permanente trucidar da grande maioria da humanidade. Um só caminho se nos põe: derrubar este sistema iníquo e construir o comunismo!

Morte ao Capitalismo!
Viva a Revolução Proletária Comunista!