A Gabor é uma empresa alemã, com uma pequena fábrica em Rosenheim, Bayern, e duas fábricas principais, uma em Portugal, a Gabor Portugal - Indústria de Calçado, Lda. em Silveiros, e outra na Eslováquia, a Gabor Spol. S R.O. em Banovce Nad Bebravouslowakei. A fábrica da Eslováquia explora cerca de 1000 operários na fabricação de componentes para a indústria do calçado e afins em couro, tecido, borracha, plástico e metal.
Se anteriormente a Gabor Portugal absorvia as “flutuações do mercado” com o recurso ao exército industrial de reserva, ora mobilizando-o ora desmobilizando-o, transferindo assim os custos do que chamam de “riscos dos investimentos” para as costas dos operários, agora foi directamente ao núcleo duro da empresa, numa redução de cerca de 25% na capacidade de produção! Desta vez não foram só operários, foram equipas inteiras! O argumento apresentado é a necessidade de ajustar a capacidade produtiva num contexto económico de crise de encomendas devido a quebra acentuada nas vendas, e de acumulação e excesso de stocks. Catástrofe mercantil? Os alemães deixaram de comprar calçado (convém saber que a quase totalidade da produção da Gabor é exportada para a Alemanha)? Surgiu nesse mercado um competidor demolidor? Não, nada disso!
Quando muito, a existir um competidor demolidor, ele é a própria Gabor. Neste momento estão a ser fabricados na Índia centenas de milhares de pares de sapatos Gabor, porque a Gabor franqueou a marca à empresa indiana
TATA International que tem duas fábricas de calçado, uma em Dewas, no estado de Madhya Pradesh, e a outra na capital do estado de Tâmil Nadu, Madrasta, com uma capacidade de produção conjunta mensal de 200 000 pares de sapatos e 13 000 outros artigos de couro. Daí terem vindo da Índia para Silveiros algumas dezenas de operários aprenderem a fabricação.
Sendo a Índia o maior exportador mundial de calçado em couro (com um preço médio de 9€/par comparando com os 30€/par do preço médio do calçado exportado por Portugal), a Alemanha é o seu terceiro maior cliente (após os EUA e o RU). Trata-se, portanto, de plano gisado em Rosenheim para aumentar a taxa de lucro transferindo partes da produção para a Índia num processo semelhante ao que “beneficiou” Portugal há 39 anos quando a Gabor abriu a fábrica na Trofa e depois a transferiu aumentada para Silveiros.
É o capitalismo a funcionar na sua maior perfeição. Só que ninguém esperava, nem era preciso, tamanha crueldade e tão grande desprezo pela dignidade dos trabalhadores. Não houve “preparação”: os trabalhadores foram surpreendidos durante o trabalho com as cartas de despedimento; alguns, em baixa, foram chamados à fábrica para receberem a carta; e até foi pedido a uma mãe que levasse a carta ao filho e que, em terror, assinou por ele; de tudo se viu! Fala-se em clima de funeral entre os trabalhadores.
Há famílias inteiras entre os que receberam as cartas; muitos estão a comprar casa e/ou a comprar carro. 3 meses não é nada para encontrar outro emprego! O que acontecerá quando as arrecadas se esgotarem, sendo que os encargos se vão manter?
Que dizer de um regime que obriga quem não tem tecto e quer viver dignamente a comprar casa e depois permite o despedimento de quem depende da venda da sua força de trabalho para pagar o empréstimo que contraiu para a pagar?
Na Gabor não existe comissão de trabalhadores e o número de sindicalizados é reduzidíssimo. Os sindicatos sempre se mantiveram à margem e nem o facto de a camarada Maria José ser delegada e dirigente do Sindicato do Calçado, Malas e Afins, Componentes, Formas e Curtumes do Minho e Trás-os-Montes o moveu para tomar posição e organizar a resistência dos trabalhadores ao despedimento.
É preciso que uma comissão de trabalhadores se constitua e conteste os despedimentos, não que discuta os critérios de escolha dos despedidos como é pretendido, mas que ponha em causa a "medida de gestão adequada, proporcional e racional" do sr. Ralf Rasemann. Os argumentos patronais são falaciosos pois basta que reduza o montante de calçado contratado com a TATA International para o argumento do contexto económico de crise de encomendas e quebra acentuada das vendas da Gabor Portugal (não da Gabor a casa mãe e “compradora” alemã que continua a vender normalmente na Alemanha, Áustria, Bélgica, Suiça, França, Itália, Holanda, Suécia e, a partir do Reino Unido, para o resto do mundo, mas da Gabor Portugal, entenda-se) cair. E a TATA International pode muito bem direcionar a capacidade produtiva libertada para mercados sedentos de calçado como o chinês (cujos preços de importação médios estão acima dos 30€/par, muita acima dos 9€/par das exportações indianas – dados de 2024 da APICCAPS, in “O CALÇADO NO MUNDO”).
Isto para já. Mas sabemos que novas ondas virão. São inevitáveis. O capitalismo é assim: vive da exploração do trabalho e do permanente trucidar da classe operária, de facto, do permanente trucidar da grande maioria da humanidade. Um só caminho se nos põe: derrubar este sistema iníquo e construir o comunismo!
Morte ao Capitalismo!
Viva a Revolução Proletária Comunista!