Este é um primeiro artigo de uma série de três em que analisarei sucessivamente os três partidos da Esquerda parlamentar portuguesa: o PS, o Bloco e o PCP.

O Partido Socialista, desde os dias longínquos do PREC (Processo Revolucionário em Curso, período histórico que decorreu entre meados de 1974 e Novembro de 1975) que se constituiu como um Partido representante dos interesses do imperialismo americano e europeu em Portugal, procurando sistematicamente integrar o país no campo capitalista dominado pelos norte-americanos.

Para a persecução dos seus intentos contou sempre com o apoio americano (todos recordamos o papel determinante de Frank Carlucci no financiamento do PS) e o dos principais dirigentes europeus. Para alinhar o país com esses interesses externos promoveu, com sucesso, e em grande coligação com o PSD e o CDS, à implantação de um regime de democracia formal ocidental e a abertura do país ao investimento estrangeiro, nomeadamente americano e europeu. O seu principal credo é o do neoliberalismo. Foi o partido que colocou por três vezes o país sob intervenção direta e prolongada do FMI, nas primeiras duas vezes com Mário Soares e da terceira com José Sócrates.

Acontece, porém, que os tempos mudam e com eles os próprios interesses dos patronos americanos. A globalização dizimou a indústria americana e europeia, a emergência da China apavora o ocidente, o centro da atividade económica transferiu-se para a Ásia (China, Índia, Japão, Coreias, Singapura, Indonésia, etc,), o domínio tecnológico americano tem agora competidores fortes reduzindo as vantagens competitivas das grandes multinacionais ocidentais, os EUA tornaram-se grandes exportadores de energia.

Face a estes desafios a política norte-americana sofreu alterações significativas que exigem um reposicionamento dos países dependentes como Portugal. Exige-se o pagamento de tributos (tarifas), de gastos militares, de perda de direitos e garantias constitucionais, a alteração profunda das regras internacionais.

O Partido Socialista, preso às ideias anteriores neoliberais, já arcaicas na nova política da grande potência, deixou de representar os interesses americanos e europeus. Nesse sentido perdeu a sua razão de ser. A crise instalou-se.

A sua esperança, absolutamente vã, está no regresso do Partido Democrata ao poder nos Estados Unidos, não percebendo que a velha ordem está acabada e que mesmo Biden, quando na Presidência, não desfez a política da anterior administração Trump quer na sua confrontação com a China quer no reposicionamento cada vez mais subalterno dos satélites europeus, tendo-os mesmo empurrado para uma guerra na Europa que os está a enfraquecer. A realidade é que as necessidades americanas são agora outras e não vão mudar nos próximos anos.

O quadro político que os americanos querem implementar na União Europeia visa a criação de um regime político dependente assente em valores conservadores, na limitação substancial da liberdade de informação, num contrato social totalmente favorável ao Capital com desmantelamento de partes fundamentais do Estado Social (nomeadamente no setor da Saúde e da Segurança Social), num maior grau de autoritarismo e controlo do poder executivo sobre os poderes legislativo e judicial. Este projeto estratégico implica a bipolarização entre um setor de extrema-direita e outro da direita conservadora, sem lugar, ao nível do poder político, para os socialistas (a não ser como parceiros menores da direita conservadora).

Assim a crise estrutural do PS é também a da sua família política europeia. Por todo o lado os Partidos agrupados no Partido dos Socialistas Europeus, outrora no poder em grande parte da União Europeia, enfrentam um forte declínio. Em muitos países transformaram-se em pequenos partidos ou até em Partidos extraparlamentares, apesar de em Espanha, Malta e Dinamarca estarem no poder e na Alemanha integrarem como parceiro menor o Governo dos conservadores.

A crise do PS resulta assim do esgotamento do seu papel histórico de, simultaneamente, correia de transmissão, acomodação e de amortização de interesses externos no nosso país. Os interesses externos mudaram e para a sua implementação o PS já não é necessário. Sem utilidade visível para os seus antigos patronos o PS surge como um Partido em crise de identidade, sem futuro, vivendo apenas de um ímpeto e de uma implantação passada mas em permanente declínio e já não como polo alternativo à AD.

Nestas circunstâncias o PS pode vir a dividir-se em várias alas como o fez o Partido Socialista Francês, em que parte aderiu ao macronismo (Macron ele próprio Ministro de um Governo socialista), outra parte à França Insubmissa e uma terceira parte, residual, que se manteve no PSF. O cenário de divisão parece ser já visível no posicionamento de diversos dirigentes de topo do PS face ao candidato presidencial António José Seguro.

Perdida a razão profunda e material de ser o futuro do PS não se afigura brilhante.

Artigo de Opinão: Jorge Fonseca Almeida