Daí que sejam  bem anti patrioticos os insultos feitos  por dois homens numa cerimónia de homenagem aos ex-combatentes no dia 10 de Junho

O imã  David Munir lider islâmico em Portugal há quase 25 anos que é convidado para a cerimónia interreligiosa, católica e muçulmana, de homenagem aos ex-combatentes.

Nunca tinham  acontecido  ataques racistas . “No fim da minha intervenção disse: 'Esta é a nossa pátria'.” E entao dois homens na assistência começaram a gritar “traidor” e “esta não é a tua pátria”.

Só aí percebeu que os insultos eram para si.

Mais tarde, estes  homens duvidosamente antigos combatentes quando muito antigos militares juntaram-se ao  grupo que fazia a saudação nazi.

Nas redes sociais, David Munir escreveu que as palavras que lhe dirigiram o feriram, “não apenas pela injustiça, mas por ver um espaço de oração e homenagem ser transformado num espaço de exclusão”.

Segundo Munir  a comunidade muçulmana em Portugal foi criada nos anos 60 do século passado e sabe  que, com a nova vaga de imigração, há mais cidadãos muçulmanos, mas pede-lhes sempre que tentem aprender a língua e se integrem no país.

David Munir lamenta que os extremismos estejam originem atos de ódio.

“Infelizmente a maioria das pessoas só acredita naquilo que dizem as redes sociais (...), então ódio gera ódio”, afirma.

O imã acentus  que muitos muçulmanos chegaram a Portugal vindos das ex-colónias, do antigo Imperio português que como se vê os hodiernos fascistas odeiam.

“Nós somos portugueses, a nossa língua é a portuguesa”, sublinha.

”Há muçulmanos que no passado foram militares e deram as suas vidas pela pátria que é nossa e ainda hoje há muçulmanos a servirem o Estado”, acentua.

Num comunicado no Instagram, o imã da Mesquita de Lisboa adianta que, perante este episódio, ficou com o “coração pesado”, mas garante que continuará a estar presente nesta cerimónia, “sempre que for chamado e sempre que a paz e a dignidade humana sejam o centro”.

E para apoiar o imã Munir deixo um texto do Diario do Minho de 2020, D. Afonso Henriques e a tolerância religiosa de Narciso Machado sobre as 3 religiões que comviviam no reino de Afonso Henriques que apesar dos 916 anos que hoje teria é bem mais moderno que esses 1143 ou cheganos de hoje!

 

D. Afonso Henriques e a tolerância religiosa

 

A associação “GRÃ-ORDEM AFONSINA”, criada em Guimarães, em 13.02.2019, tem por fim estatutário “o estudo, a investigação e divulgação dos mais variados aspetos históricos da Vida e Obra do Primeiro Rei de Portugal, em especial, daqueles que constituem um património imaterial da cidade de Guimarães”, bem como a figura de D. Afonso Henriques como símbolo identitário de Guimarães que lhe serviu de berço”.

É no cumprimento desses objetivos que deve ser encarado o presente artigo, substituindo sinteticamente, um trabalho pronto para a Secção Cultural do DM, agora suspensa.

No tempo de D. Afonso Henriques eram três as religiões que se praticavam no reino: judaísmo, cristianismo e islamismo, hoje designadas como as religiões do Livro.

Uma breve análise dos factos históricos revelam a sua tolerância religiosa.

Quanto ao judaísmo, embora não haja documentação local averiguada, defendem alguns autores ser verosímil a presença de hebraica no ocidente peninsular no tempo de Estrabão (58 a. C a 25 d.C) e Filon (13 a C a 54 p. C). Foi no séc. I da era cristã que chegou à Península a doutrina do Evangelho, como é de presumir da alusão de S. Paulo à existência de colónias judaicas em Espanha: “...agora que terminei o meu trabalho nestas regiões, espero ir ter convosco (cristãos de Roma”)...”Irei visitar-vos quando for de viagem a Espanha...” (cf. Carta aos Romanos, 15,23-24).

Em 711, veio uma expedição do norte de África, comandada por Tarique, desembarca em Espanha e desbarata completamente o exército do rei visigodo.

O rei Rodrigo morre na luta e com ele a monarquia visigoda. Bastaram cinco anos para que os muçulmanos dominassem praticamente toda a Península. Aos cinco anos da conquista muçulmana corresponderam mais de setecentos anos de reconquista cristã.

Não obstante as lutas da reconquista, operadas pelo nosso primeiro monarca, nunca as minorias judaicas e e muçulmanas deixaram de existir e de afirmar as suas diferenças culturais e religiosas.

Em Lisboa, e em outras regiões, ficaram até a viver em bairros próprios (mourarias) com alcaide, eleito de entre os da sua raça e da sua fé.

Com igual tolerância viviam os judeus nos seus bairros (judiarias), com as suas comunas e sinagogas.

Ambos tinham juízes privativos: alcaides dos mouros e rabis dos judeus.

Com o tempo, foram-se estabelecendo relações normais entre cristãos e muçulmanos na vida quotidiana que não podiam deixar de influir na formação de certos costumes comuns e na adoção por cada uma das populações, de algumas regras jurídicas da outra, no tocante ao comércio, vida económica e aos contratos.

Vivendo nas cidades e em bairros próprios e no campo, mesmo que em forçado convívio, muitos cristãos foram-se mesclando com muçulmanos e adotando trajes, usos e termos deles.

Eram os moçárabes, ou seja, semelhantes aos árabes.

Assim, enquanto alguns cristãos abandonavam o seu credo (os renegados, muledies), outros só na cultura e modo de viver se arabizaram (moçárabes).

Mas, não se exagere nessa influência muçulmana, porquanto nesses séculos, nunca deixaram de ser vistos como invasores cujo território urgia reconquistar. Relativamente à tolerância religiosa de D. Afonso Henriques, salienta-se “a carta de fidelidade (amizade) e segurança” concedida, em março de 1170, “tomando sob a sua proteção os “mouros forros” (livres) de Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer do Sal”.

De acordo com este documento, D. Afonso Henriques garante aos muçulmanos, “a quem após a comquista fora conservada a liberdade, que nenhum dano sofreriam em Portugal e que a nenhum cristão seria reconhecido o poder de os lesar.

Ficariam sujeitos apenas ao alcaide que elegessem entre os da sua fé” (cf. Portugaliae Monumenta Historica (P.M.H.)-Leges-pág. 396,

Esta carta contém disposições legais definindo o estatuto da comunidade muçulmana no seio da sociedade cristã que garantia, além de outras, a liberdade de religião.

Segundo a prof.ª Eva Maria Kemnitze este documento constitui uma das facetas mais ignoradas da História de Portugal (cf. Artigo publicado no Livro das Atas do 2.º Congresso Histórico de Guimarães).

A história religiosa das três culturas demonstra que, em determinadas épocas e regiões (e ainda hoje), essas culturas cultivaram a intolerância religiosa, não obstante tal conduta não se enquadrar no âmbito da doutrina dos respetivos Fundadores.

Tal facto confere maior importância à política do nosso primeiro monarca relativamente às três religiões.

A propósito dos conflitos no Médio Oriente e do terrorismo dos extremistas islâmicos, fala-se no diálogo intercultural e inter-religioso como forma de obter a paz entre as religiões e as nações.

Saliente-se, no entanto, que a atual hostilidade entre entre muçulmanos e judeus não é uma inevitabilidade histórica, porquanto, em muitos aspetos, muçulmanos e judeus estão mais próximos do que em relação aos cristãos.

Na verdade, conviveram bem ao longo dos séculos, não só em Espanha e Portugal, como em Istambul (Turquia) e nos Balcãs.

O seu profundo antagonismo, na atualidade, surgiu apenas no século XX e, nada tem a ver com a religião, mas sim com o conflito político entre israelitas e palestinianos, de tal modo que a relação entre judeus e muçulmanos não poderá melhorar sem se resolver o conflito israelo-palestiniano.

Autor: Narciso Machado